quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Uma mensagem às mulheres livres


Rose W. Lane, pioneira da liberdade e
da luta contra todos os preconceitos
*Por Carlos Góes
Este texto foi motivado pela seguinte situação, ocorrida durante a cerimônia de posse da Gestão Aliança pela Liberdade para o DCE Honestino Guimarães: "Uma representante do Centro Acadêmico de Sociologia (CASO) disse não se sentir representada por uma mesa composta apenas por homens e pediu para conhecer as mulheres da Aliança. Quando Mariana Sinício, nova coordenadora geral do DCE iniciou as apresentações, veio um grito da platéia: 'submissa'. Mariana interrompeu as vais e pediu respeito: 'Se eu disse que sou coordenadora geral não tem ninguém acima de mim, logo não sou submissa. Vocês pediram para nos apresentarmos, então nos deixe falar'." (para mais, ver Campus Online). Anteriormente, a coordenadora-geral Mariana Sinício tinha declarado: "Nós não nos sentimos excluídas. Na Aliança não existe separação por gênero".

A declaração de que não existe uma diferenciação entre homens e mulheres na Aliança pela Liberdade é perfeita. É exatamente nisso que um pano de fundo de liberdade individual implica. A sociedade ideal em que acredito não é aquela que dá tanto enfoque às diferenças a ponto de exacerbá-las. É um ideal exatamente contrário a isso: é uma sociedade que dê tão pouca importância às diferenças a ponto que elas, embora múltiplas, se tornem banais.

Quando chegarmos à banalização das diferenças, seremos tão diferentes que seremos todos iguais (em dignidade e direitos). Seremos todos igualmente indivíduos, mas sem qualquer tentativa autoritária de uniformização das nossas particularidades. Pois são essas desigualdades múltiplas, essas particularidades diversas, que criam a necessidade de vida em sociedade. É nossa pluralidade que torna a vida tão bela - que torna a liberdade tão necessária.

Para além disso, parabéns pela coragem de terem aceito essa missão em nossa Aliança. Aqui, sabemos que mulheres são competentes, inteligentes e eficientes - e que a única coisa que vocês precisam para conseguir destaque e prosperar é que não haja barreiras de entrada. Aqui, essas barreiras não existem - não fazemos divisão de gênero. Aqui, para parafrasear Martin Luther King, as pessoas são julgadas pelo conteúdo do seu caráter - e não por seu gênero. Não é nada inesperado, portanto, que em um ambiente livre as mulheres se destaquem - e tomem papel de liderança. Vocês são exemplos claros de que política, debate e liderança é sim lugar de mulher - é lugar de mulheres inteligentes e competentes como vocês.

As críticas já começaram a chegar. De forma interessante, a crítica ao sucesso de vocês vem mais de mulheres que de homens. São mulheres que, ao contrário de vocês, têm espírito autoritário e querem-lhes negar sua própria liberdade. Acham que detêm o monopólio da feminilidade - e que as mulheres que não militam do modo que elas acham correto não são "mulheres de verdade", mas somente machos cujos sexos lhes foram arrancados.

Esse espírito totalizante, que quer resumir toda a bela complexidade de todas as mulheres em um tipo ideal, é ignorante. Mulheres são indivíduos completos compostos por diversas identidades: nacional, sexual, ideológica, religiosa, étnica, de gênero, entre outras inúmeras. A identidade individual reside na justaposição dessa miríade de diversas identidades coletivas. Por isso, esse espírito totalizante é ignorante, pois não percebe que as mulheres são tão diferentes entre si quanto em comparação com homens.

Gênero é apenas uma das facetas das mulheres - não sua totalidade. Em última instância, cada mulher (e cada homem) é um universo em si mesma. Universos diversos, plurais, únicos! As diferenças são tão grandes que são... banais! Por isso, louvo o trabalho de vocês não porque vocês são mulheres, mas porque vocês são competentes, inteligentes, eficientes e inspiradoras. Não fazemos separação de gênero porque aqueles que realmente são isentos de preconceito tomam gênero como uma variável irrelevante - o que importa é tão somente o conteúdo do caráter.

Por fim, uma mensagem de ânimo: não se deixem abater. Vocês são mulheres livres. E mulheres livres são aquelas que escolhem seus próprios destinos. Mulheres livres são aquelas que se levantam para defender aquilo que julgam correto - ainda que sob crítica, ainda que tenham de se levantar sozinhas. Vocês não precisam de anuência ou de bênção de ninguém - somente daqueles que vocês livremente escolherem como confidentes e conselheiros.

No fundo, de fato, uma mulher precisa de um homem (ou de outra mulher) tanto quanto um peixe precisa de uma bicicleta. Verdadeiramente, a única coisa que uma mulher precisa é de liberdade. Sendo livre, pode ser plena.

*Carlos Góes é membro fundador da Aliança pela Liberdade, bacharel em Relações Internacionais pela UnB e mestrando em Economia Internacional pela Johns Hopkins University.

O conteúdo deste texto é de total responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião da Aliança pela Liberdade.

12 comentários:

Anônimo disse...

Muito bom. Isso me lembra uma frase da Tina Fey no SNL:
"There are five (ou outro número quelquer)women in space right now. 20 years ago that would only be possible in a porn movie. Now it's science/reality. And you know what's the real sign of progress? No one cares."

Brilliant.

BTW, parabéns por está fazendo mestrado na JHU.

Bruno disse...

Cara, não tenho absolutamente nada contra sua chapa. Inclusive concordo com seu posicionamento quanto às atribuições do DCE, e as propostas que estão fazendo para a UnB. No entanto, acho que o texto, embora tenha seus pontos altos, pecou em duas coisas:

1) Você parece estar confundindo gênero com sexo. Reconheço que um colega economista não precisa saber disso, e talvez eu só esteja a par dessa distinção porque ando com muitos historiadores e sociólogos. O fato é que o conceito de sexo é biológico, ou você tem órgãos reprodutivos femininos ou masculinos, enquanto o de gênero é uma construção social. Existem muito mais que dois gêneros, que não necessáriamente têm qualquer coisa a ver com o sexo da pessoa.

2) Dizer que não tem preconceitos é uma alegação e tanto. Todos temos preconceitos, e é a consciência desses preconceitos que faz com que consigamos combatê-los. Mesmo a pessoa mais mente aberta não pode viver no mundo sem nenhuma idéia pré-concebida. Essa seria uma pessoa que nunca faz nenhuma afirmação categórica, e isso é impossível. Melhor, então, não professar que não possui preconceito algum, na minha opinião.

Achei bom dar esse toque. Ambos conhecemos a tendência que certos grupos têm de atacar discursos de ideologia oposta, sem nem mesmo tantar entender o que este quis dizer.

Bruno disse...

Cara, não tenho nada contra a sua chapa. Inclusive, concordo totalmente com a visão da mesma sobre o que são as atribuições do DCE, e apoio a maioria de suas propostas, tanto que votei para vocês. Por esse motivo mesmo, me senti na obrigação de esclarecer alguns pontos insatisfatórios do seu texto:

1) Você parece estar confundindo gênero com sexo. Sexo e gênero são conceitos diferentes. Eu entendo que essa distinção não seja óbvia para um colega economista, já que eu mesmo só estou ciente dela por causa que ando muito com historiadores e sociólogos. Entretanto, antropológicamente, "sexo" é uma categoria biológica, enquanto gênero é uma construção social. Quanto a sexo, você é "macho" ou "fêmea", pois nasce com órgãos reprodutivos femininos ou masculinos, e fim de história. Já gênero, existem infinitos possíveis, e eles não estão sempre ligados a seu sexo biológico.

2) Dizer que alguém não tem nenhum preconceito é uma alegação e tanto. Todos temos preconceitos, e é reconhecendo isso que podemos combatê-los. Mesmo a pessoa mais mente aberta não pode funcionar sem nenhuma idéia pré-concebida. Afirmar que alguém não tem preconceitos é o mesmo que dizer que essa pessoa não faz nenhum julgamento categórico, o que não pode ser dito de nenhum ser humano.

Sabendo que certos grupos têm o hábito de atacar discursos de ideologia oposta tendo como base conceitos avulsos, sem tentar entender o que a pessoa quer dizer, achei que era pertinente fazer essas críticas.

Deco disse...

Bruno, críticas respeitosas e inteligentes como as suas são sempre muitíssimo bem-vindas. Certeza de que em breve o Góes virá fazer considerações a respeito do seu comentário.

Góes disse...

Bruno, obrigado pelas críticas.

Mas acho que não estou confundindo não. Eu quase me formo em ANTRO enquanto estive na UnB (faltaram 36 créditos) e minha monografia foi sobre identidade (nacional) (veja: http://dl.dropbox.com/u/17824416/GOES%2C%20Carlos%20%282011%29%20-%20Monografia%20Final.pdf ). Sei que gênero se refere a identidade, como eu deixei claro no quinto parágrafo.

A única vez que eu usei "sexo" foi no sentido figurado, para usar um argumento similar à crítica de Paul Gilroy aos movimentos negros no combate ao racismo. Gilroy cita um exemplo de um protesto na Inglaterra em que o movimento negro dirigiu sua revolta contra um policial negro que estava ali pra controlar o protesto. Afinal, se ele não militava, não seria "negro de verdade".

Essa visão totalizante de mundo exacerba uma das facetas da identidade. No caso presente, a de gênero. Mais que isso, tenta forçar a identidade de gênero a um modo específico de construção daquela identidade.

Quanto a segunda crítica, você está certo. O ideal levantado aqui é... um ideal. O mundo da banalização das diferenças, o mundo da morte dos preconceitos pela morte da origem dos preconceitos (a ênfase na diferença). Mas essa era a ideia.

Se quiser desenvolver mais a crítica, eu agradeceria.

Anônimo disse...

Vocês são estudantes mas adoram vestir gravata, pelo que percebi em umas 2 fotos, defendem cursos pagos (ou fundações de direito privado, o mesmo desvirtuamento da universidade PÚBLICA com outro nome) e, pasmem, fazem uma leitura revisionista para criminalizar a luta armada contra a ditadura, sendo que foram eleitos para o DCE Honestino Guimarães, um mártir... da luta armada! Não terminou... ainda por cima querem a PM no campus, a PM que em 1968 marcou o mais triste capítulo da história da UnB, história de que vocês dizem se orgulhar. Ah, mas eles mudaram... milico não muda nunca. Ou vocês já viram PM dando dura em banqueiro que dirige bêbado, que é apanhado em apartamento de luxo com cocaína?

A quem pretendem enganar? São de direita sim, como demonstram os comentários do vídeo no You Tube. Seus colegas ali pelo menos são honestos, falam logo que "derrubaram os esquerdopatas" e ponto final. Vocês se dizem apartidários, mas incorporam todo o discurso batido dos "pagadores de impostos", até o ódio ao MST. Vocês sabem o que é passar a vida como um semiescravo de latifundiário?

É uma pena. Tão jovens... tão velhos. Não se lambuzem muito, será por pouco tempo.
Rodrigo, ex-aluno da UnB (História)

Gabriela disse...

Olá, Góes! Meu nome é Gabriela, estou me formando em ANTRO, e estou no exterior, também e por isso não pude acompanhar as eleições de perto. Mas venho parabenizá-los pela vitória. Estávamos, mesmo, precisando de novos ares naquela universidade. Sinceramente, espero que vocês façam um bom trabalho e façam jus à confiança que estão depositando na chapa Aliança. Estou farta de sentir medo de andar pelo campus sem segurança, podendo ser assaltada ou estuprada a qualquer momento. Não só eu, mas ainda tenho uma irmã e minha mãe no pensamento quando sinto esta insegurança terrível. Eu assim como outros estudantes da "sociais" (que existem, sim, ao contrário do que possa parecer) estamos esperançosos com a vitória de vocês. Abraço. Gabriela.

Anônimo disse...

Se esse Rodrigo consegue ver alunos de terno neste blog, faz sentido que ele vizualisse todo esse mundo fantasioso narrado em seu comentário. Vocês da Aliança fazem muito bem: alguém assim deve ser ignorado.

Saulo disse...

Se o Rodrigo responder as 8 questões que se seguem, responderei suas acusações com muito prazer. Eis o desafio:
1. Onde estão os engravatados da Aliança? Havia um, que não aparece na foto, o qual voltava do trabalho (no dia da posse). Trabalhar é crime?
2. Onde você viu a Aliança se posicionando sobre ou defendendo cursos pagos?
3. Qual a semelhança entre cursos pagos e fundações de direito privado?
4. Leitura revisionista para criminalizar a luta armada? Onde mesmo?
5. Quando negamos que Honestino é um marrtir? Acaso leu nosso discurso de posse?
6. Por que a PM invadiu a UnB para perseguir estudantes de esquerda em 1968, logo, em 2011 , ela fará o mesmo? 40 anos, um novo regime político, isso não faz diferença?
7. Somos de direita como demonstram os comentários do vídeo no YouTube? Quem da Aliança escreveu algo lá que prove que somos de direita mesmo?
8. Quando nos manifestamos a respeito do MST mesmo? Quem foi mesmo que disse que a vida no "latifundio" era fácil?

Góes disse...

Velhas são as ideologias anacrônicas que dominam o velho movimento estudantil. A vanguarda do século 19 não vai nunca liderar as mudanças na Universidade do Século XXI.

Que ternofobia é essa? Estudante é menos estudante se trabalhar e usar terno. Acho que ninguém deve se desculpar por seu trabalho (nem por sua elegância).

Góes disse...

Rodrigo, seu comentário é tão cheio de preconceito. "Milico não muda nunca". Como se policial militar não fosse ser humano, não fosse trabalhador, não tivesse família. Vamos parar com esse maniqueísmo. Deixe de viver no passado, por favor. A ditadura acabou. Vencemos. Instauramos o Estado Democrático de Direito.

Acho que antes de tudo, é injusto que a Universidade não possa conviver com o as mesmas instituições de segurança do Estado Democrático de Direito que são utilizadas pela sociedade que a sustenta. Se a PM atua em toda a cidade, e a universidade faz parte da sociedade, porque seria temeroso que a mesma instituição atue no campus? Ainda que as rondas da PM representassem um atentado à liberdade (o que eu não concordo), como sustentar a ideia de que a presença dela é ilegítima na Universidade, mas não no resto do DF?

Obviamente, temos que ser contra os abusos de poder e os desvios de conduta - que são, como diz o nome, desvios da conduta padrão. Também acho que cada missão da PM tem um treinamento específico. A atuação do BOPE não é igual às rondas ordinárias da PM. A atuação na Universidade também é peculiar. Devemos buscar a criação de um Batalhão Universitário - algo similar ao existente Batalhão Escolar - que tenha um treinamento específico e particularidades - como, por exemplo, a atuação exclusiva nas áreas externas da UnB, o uso de armas leves e o estímulo para maior integração com a comunidade universitária de modo a superar os preconceitos anacrônicos que ainda vivem por aqui.

Por isso, acho que devemos ter um Plano Comunitário de Segurança que envolva iluminação, rotas seguras de saída, treinamento regular dos seguranças e um convênio com a polícia militar nos termos citados acima. Precisamos de uma abordagem completa.

Há braços libertários!

João César disse...

Carlos, gostei do texto. Sobretudo da idéia de que o gênero é apenas uma das facetas das mulheres e que pouco ou nada dizem da capacidade, da vontade ou do potencial de alguém. O ideal é que ninguém se apegasse a "facetas" para admitir, demitir, remunerar, aceitar ou respeitar alguém. Mas no mundo real nós sabemos que não é assim. Banalizar as diferenças no estágio em que estamos me soa como ser indiferente a injustiças feitas com base nelas. As mulheres ganham menos, as mulheres apanham mais em casa, as mulheres têm menos oportunidades, independente de serem ou não melhores naquilo estão fazendo. Meu ideal de sociedade pluralista não é a que vê diferenças como banais, mas como oportunas, enriquecedoras e legítimas. Sou a favor de certas políticas afirmativas que garantam espaço para certos grupos marginalizados por determinadas "facetas" suas, até que essas diferenças deixem de ser motivo de preterimento. Todos nós sabemos que a maioria pode ser cruel, principalmente quando munida de preconceitos exclusivistas. É claro que com o tempo mudanças podem acontecer, para melhor ou para pior, mas duvido que as mulheres teriam o grau de liberdade que têm hoje se não fosse os movimentos feministas. De todo modo, creio que a discussão que houve no evento citado foi entre mulheres (e homens) livres, portanto o foco não é a liberdade ou a falta dela, mas projetos e visões diferentes de mundo. Isso me remete à dificuldade que tenho de aceitar o liberalismo como ideologia, uma vez que acho tão óbvio defender a liberdade quanto defender a paz, a saúde e o amor. Os grandes conflitos da sociedade não são regidos pela dicotomia liberdade X cerceamento dela (em termos gerais), mas pela convivência e o arbítrio entre a minha liberdade e a dos outros e entre a minha liberdade de escolher abrir mão de parcela dela em nome de outros valores como segurança, bem-estar, igualdade, etc. Para ser sincero, banalizaram tanto a palavra liberdade que, para mim, às vezes ela carece de carga semântica e de aplicabilidade prática.

Há braços pragmáticos!

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