Um motivo a mais para sermos diferenciados no movimento estudantil.
Desde que passamos a atuar no movimento estudantil nos familiarizamos com o jargão próprio dos grupos veteranos nessa arena política. Entre tantas outras expressões, a que mais chamou a atenção é a classificação de uma pessoa como sendo ou não “de luta”. Ser de luta, conforme aprendemos pelas explicações e pela prática das pessoas qualificadas como tal, é não medir esforços na conquista das pautas do grupo que o militante representa ─ ou pensa representar.
Ser de luta é ocupar um prédio em nome de uma causa política, enfrentar a polícia, abrir mão de qualquer compromisso (inclusive aulas) em prol do “movimento” e jamais amargar uma derrota sem lançar mão de praticamente todos os métodos de pressão possíveis.
Ouvi certa vez um veterano do movimento estudantil dizer que a ocupação da reitoria é legítima porque conseguiu destituir o reitor envolvido num escândalo de corrupção, bem como sua administração. Eu, confesso defensor da Democracia procedimental, respondi-lhe que se o objetivo era destituir o reitor e tudo o que contribui para isso torna-se justo e legítimo, então deveriam ter seqüestrado um familiar dele (tal como as FARC) a fim de apressar sua saída...
Evidentemente não recomendo seqüestros; apenas quis reduzir ao absurdo a tese de que a causa vale mais que o procedimento ou método político. Os fins, definitivamente, não justificam os meios. Evidentemente também, nunca defendemos o ex-reitor, nem somos inimigos da causa quando discordamos do método.
Nós da Aliança, definitivamente, não somos de luta. Amamos o procedimento democrático e as instituições (sobretudo os conselhos da UnB), antes de nos apegarmos as nossas propostas. Os professores, maioria atualmente nos conselhos, não são nem nossos inimigos nem inimigos da Educação. Preferimos perder dentro das regras do jogo a ganhar pela violação delas. Não somos os donos da verdade e nem acreditamos que exista uma verdade científica em matéria política.
O que realmente lamentamos é que alguns de nossos companheiros ─ para render homenagens ao jargão do movimento estudantil ─ se sentem muitas vezes missionários de uma classe social ou do corpo discente como um todo, o que supostamente lhes daria o direito de “implodir” reuniões, mostrar as partes íntimas em protestos, fazer piquetes sonoros no ICC e na FA, trancar portões, intimidar os discordantes e daí em diante.
Antes de defender nossos propostas específicas, preocupamo-nos com a imagem da UnB. Pelo que nossa universidade tem aparecido nos noticiários nos últimos anos? Decerto a excelência acadêmica (aferida pelos projetos de pesquisa e extensão, bem como pela fama dos profissionais egressos da UnB) perdeu espaço para a atuação dos colegas “de luta”, ou para os incidentes de violência no Darcy Ribeiro e nos campi avançados.
Sonhamos com o dia em que o estudante mais empenhado em estudar e pesquisar não seja mais o objeto de escárnio e desprezo do movimento estudantil. Mesmo ausente do cotidiano político da universidade, esses estudantes estão fazendo jus ao gasto que o contribuinte investe em cada um de nós. Muitos desses estudantes tem demandas que precisam ser processadas pelas instituições; precisam virar políticas.
Com certeza nossa Aliança é pela Liberdade, pelos estudantes excluídos da política estudantil e não pela luta. Liberdade pressupõe o dialogo com aquele que pensa diferente e não a supressão de suas vozes e opiniões.
Saulo Maia.
3 comentários:
Excelente artigo, muito bem escrito.
Parabéns, Saulo
A expressão "de luta" é mais uma demonstração da forma como os lídres do movimento estudantil tradicional encaram sua missão. A idéia não é o diálogo, mas o confronto. O objetivo não é convencer o outro, é vencê-lo, derrotá-lo.
A agressividade com que se expressam em momentos chave como as reuniões do CAD e CEPE e a tentativa de impedir aulas durante greves ou manifestações (vide caso da aula do Prof. Gilmar Mendes durante a presença do bem financiado mov por Cesare Battisti) derrubam a máscara dos que querem se dizer moderados.
Realmente excelente texto.Acrescento, quem vai à luta cria inimigos e ao querer lhes impor uma pauta por qualquer meio, abre precedentes para ser objeto do julgo ao sair-se vencido.
Ainda assim instituições não são objetos de amor, mas de respeito. A crítica é essencial para manter o seu aperfeiçoamento, devendo ser permanentemente garantido o respeito aos eternos terceiros interessados à sua margem.
A Aliança é pelo diálogo com respeito mútuo.
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